1919. Rescaldo da I Guerra, a guerra definitiva, a guerra de todas as guerras.
A Guerra que acabaria com todas as guerras. Irônico destino das frases feitas.
O mundo recolhe os cacos do chão, mas a confusão na sala de estar é a mesma. Vermelhos contra Verdes. Vermelhos contra Vermelhos. Verdes contra Verdes. Ninguém se entende.
Os vencidos lambem as feridas. Aos vencedores, as batatas. O butim da guerra não veio para os italianos. Perderam Fiume e a Dalmácia. De que adiantou tantos mortos?
1919. Lá está o filho do ferreiro anarquista. Até há pouco um militante socialista, expulso do time vermelho. Benito Mussolini precisa dar vazão ao seu destino. O primeiro Fascio de Combattimento é criado em Milão. Organização paramilitar que, mais tarde, se tornaria o Partido Nacional Fascista.
A Itália ainda recolhe seus mortos mas, por via das dúvidas, ainda mantem as valas das trincheiras abertas. Fantasmas de insepultos pairam sobre o céu do poderoso e extinto império. Os legionários da terra dos cesares e a saudação romana que inspira a formação das colunas fascistas, os camicie nere ("camisas negras"), representam o porvir a um presente de escombros e desvalidos.
"É com esse material decadente -com essa humanidade residual- que se faz a história".
Eram apenas algumas dezenas naquele dia em Milão. Logo se tornariam milhares, violentos e intolerantes, absorvidos pelo aparato do estado fascista.
É preciso aprender como se choca o Ovo da Serpente. A lição do dia para o Brasil de hoje.
No eletrizante romance de Antonio Scurati, o líder totalitário da Itália assume a narração dos eventos que conduziram o país a um dos capítulos mais sangrentos de sua história. O romance capta sua ascensão desde a criação da organização paramilitar que daria origem ao Partido Nacional Fascista até o momento do célebre discurso de Mussolini no Parlamento italiano, em 1925, um dos marcos do início da ditadura fascista. Hábil na costura entre narrativa envolvente e fatos documentais, Scurati utiliza-se ainda de recortes de jornais, antigos telegramas e citações diretas de fontes históricas para descrever o conturbado período.
Esse livro arrebatador rendeu ao autor a 73ª edição do Prêmio Strega, a maior honraria da literatura italiana contemporânea.
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